MADRUGADA TENEBROSA
Não foi uma noite totalmente tranquila.
Acordei por volta de uma hora e quinze, meio tonto, boca seca e certeza de ter passeado espiritualmente com Ossaim.
Ainda sentia a vibração da entidade num misto de revolta, um tanto agressiva, mostrando várias situações dentre elas destacava uma criança com uma boneca de pano.
Os companheiros já estão na lida.
Os homens se preparam para ir para o centro da cidade com a clara intenção de levantar umas pratas em transação de compra e venda de carros.
Já soltaram o ecó na estrada.
O Olode já esta alerta para abrir as porteiras, caminhos, portas e cofres.
Essa sexta-feira de outono promete.
As mulheres reunem-se em pequenos grupos, organizando o dia fora do acampamento e dentro, afinal de contas os piás ficam, bem como os anciões.
O fogão improvisado com tijolos e chapas, com as toras queimando já faz efeito na chaleira preta que da sinal de fervura da água.
Café em pó passado na hora tem seu aroma inigualável.
A primeira refeição sempre farta. Linguiça seca, frita, vários tipos de pães, biscoitos, ovos cozidos e fritos, sobra de carne da janta, fatiada, exposta na mesa com alface, tomate, azeite de oliva e pimenta em conserva.
Não, não esqueci do vinho, pois a tradição manda um brinde, alegre e festivo, louvando ao Pai clemente e misericordioso pela oportunidade que nos dá em novo despertar.
Agradecendo pela renovação da oportunidade de em mais um dia buscarmos a elevação e aprimorar nossa entidade individual rumo ao coletivo eterno.
Da minha parte nesse horário sorvo meu chimarrão e faço uma análise dos momentos passados, objetivando organizar o futuro.
Fiquei de certa forma muito impressionado com a casa que eu havia visto em um dos passeios espirituais.
Energia densa e a presença de Ossaim de verde e preto, deixava claro tratar-se de uma casa com entidades pesadas, grosseiras em suas energias.
Muitas dessas energias grosseiras e negativas são frutos de mentes invigilantes, perversas ou sofridas, que se prendem as grilhões da vingança, da cobrança descabida, sendo aprisionadas por si mesmo.
Eu senti que estava dentro da casa e que conversava com Cuira e Purumã, sobre as energias que infectam os familiares de pessoas com pesado carma, dentre eles e em questão principal para os meus dois colegas: abicus.
Eu sentia-me dentro da casa, mas ao mesmo tempo eu enxergava ela como se eu também estivesse de maneira alternada fora da casa.
Embora o aspecto fosse de casa muito antiga, eu escutei nitidamente um tocar de campainha.
Senti no lado de fora a presença de uma senhora como se fosse a mãe da menina que estava com a boneca.
Menina com aspecto maldoso e segurava a boneca de pano, molenga de uma maneira perversa.
Na minha mente um turbilhão de pensamentos, inclusive do pouco valor que Cuira estava dando para a sua vida.
Não tinha mais alegria, perdera o encanto.
Um bacuri chegou até o portal de minha tenda e me ofereceu uma maçã. Não me fiz de rogado, agradeci, peguei a prateada que trago sempre comigo fazendo 'cosquinha' na virilha e comecei a retirar a casca da maçã, com a finalidade de aproveitar as cascas para um chá após o almoço.
Nesse momento notei algo de familiar, pois se aproximava de mim Cuira, que no meu 'sonho' estava junto com Purumã.
Me deu um arrepio dos pés a cabeça, ou vice-e-versa, pois observei que as entidades que estavam envolvidas na casa de modo espiritual, estavam agora acompanhado ela.
Busquei a presença de Xapanã para que mantivesse o equilíbrio no momento e que Nanã afasta-se e orientasse os espíritos presentes e não convidados.
O tempo que levei para escrever duas linhas foram dez vezes mais lento que o tempo necessário para a mentalização e receber a energia perto.
Também foi tempo suficiente para que Cuira, deixasse escorrer pelo rosto uma lágrima.
Ela também embora dormisse em um trailer, bem equipado, confortável a 30 metros da minha tenda, sonhou com a mesma coisa que eu vivi.
A diferença que para ela foi apenas sonho, ela não pode interagir.
A entidade menina repassava a ela agressões verbais por a ter induzida a fazer um aborto, e que por complicações veio a morrer.
A apresentação dela é de um a menina de 5 a 7 anos, sempre com a boneca de pano, molenga a representar a criança abortada desfalecida.
A idade que ela tinha quando ocorreu o sinistro com ela por imposição de Cuirá deveria ser 14 a 17 anos.
Difícil organizar e entrar na mente dela devido a raiva que faz ela exalar uma densa camada de fluído negativo.
Por várias vezes conversamos sobre a questão do aborto não ser algo imposto por medidas provisórias, leis ou regras de conduta universal.
Deve ser algo a ser resolvido dentro de cada casa religiosa e principalmente no sagrado templo chamada consciência.
Decisão totalmente individual, tendo como gestor o livre arbítrio.
Todos tem direito a vida e todos tem obrigação de aceitar a morte.
Mas não podemos esquecer as regras do carma.
O acampamento que a pouco estava em alvoroço com o início da rotina individual e do grupo, agora desfalece.
Não passamos de dez do total de 95.
Todos seguem o curso como um rio, que simplesmente segue em direção ao mar.
Na minha cabeça um turbilhão de informações, como um barulho ensurdecedor de sinos a bater.
A menina abicu, se mostrava revoltada querendo explicação para a atrocidade que sua mãe obrigara ela a fazer.
Cuira, não entendia. Hoje com 21 anos, seguindo a doutrina, estudando para ser uma apetibi, não concebia a idéia de que um dia foi a favor de um crime.
Bárbaro crime, pois matar uma criança em formação, não apenas elimina a carne como cria situações horríveis para o espírito dispensado.
Não tenho certeza de que período foi, mas o que podemos observar é que foi a segunda tentativa dos espíritos da menina e da Cuira se encontrarem e da menina receber o carinho da filha que sofreu com a morte da que seria neta dela.
A reencarnação, carma, vida sucessivas são um verdadeiro quebra-cabeças, e apesar dos orixás, guias e mentores falando de várias formas, colocando farto material para estudo e aprendizado, ainda assim, e com a ajuda dos búzios, ficam muitas lacunas a serem preenchidas, desdobradas e consequentemente aprendidas suas lições de vida ao longo da estrada da eternidade.
A benção do esquecimento quando reencarnamos nos faz sentir credores, apenas, principalmente se levamos uma vida organizada, não criando obstáculos a ninguém, mas na verdade, por aparente tranquilidade na superfície não garante um poço infinitamente profundo de calmo e sereno no seu fundo.
Da mesma maneira que a impressão que ficou do meu passeio espiritual com Ossaim, e da mesma maneira que o sonho da caminhante Cuira tenha deixado nela, essa vibração estava agora ao nosso redor.
Não tem por que perder tempo.
Afastar egun é necessário.
Deve-se servir um ebó bem vistoso para Bara Talobi.
Aconselhei a Cuira e Purumã a escolher 4 rosas brancas, abertas.
Deixarem elas desprovidas de folhas, espinhos e caules e colocarem em infusão em 2 litros de água limpa e fria.
A infusão deve ficar por um período de 6 horas. Após coar e separar as pétalas que devem ser juntas com o caule, folhas e espinho para serem despachados em campo verdinho onde não tenha trânsito de pessoas da família delas.
Use a água para lavar o rosto, tendo o cuidado de que os olhos permaneçam abertos. Proceda a operação de lavagem do rosto 4 vezes.
Para esse mesmo axé separe restos de comida de 4 refeição. Vá até uma árvore velha ou morta e acenda 9 velas de sebo oferecendo junto com a comida para as Santas Almas Benditas E Abençoadas, para que lhes livre das energias grosseiras dos inimigos espirituais.
É importante enaltecer que nada fica sem ser visto, anotado e cobrado pela justiça divina, bem com da misericórdia divina.
Orumilaia tudo vê, orienta através dos búzios para que possamos reorganizar o que de certa forma estragamos.
Mas nunca poderemos esconder embaixo do tapete da estrada da vida a verdade de cada um de nós. Guardada em nossa consciência, com virtudes e com defeitos, mas que só a nós diz direito.
Não pagaremos dívidas que pertençam a outros e muito menos alguém saldará nossas pendengas.
Somente nós somos responsáveis pelos nossos atos, Créditos e débitos....
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